Última parada
No segundo dia de hospedagem em Camogli decidimos fazer um passeio por Florença. Há duas versões sobre o destino do rinoceronte: alguns dizem que o corpo empalhado do animal foi enviado a Roma e outros que foi enviado a Florença pela dinastia dos Médici, que governava este município.
Como Florença é considerada o berço do Renascimento e uma das cidades mais belas do mundo, decidimos aceitar a segunda versão como verdadeira e terminar nossa viagem passeando pelas praças do Duomo e Signoria, atravessando a ponte Vecchio e visitando a galeria Uffizi, onde está uma das coleções de arte mais importantes do mundo, com obras como “A Anunciação” de Da Vinci, “Baco” de Caravaggio e “O Nascimento de Vênus” de Boticelli. O “David” de Michelangelo, por sua vez, está na galeria da Academia de Belas Artes, mas uma réplica da estátua pode ser vista na praça da Signoria.
Apenas 218 quilômetros separam Camogli de Florença e a visita pode ser feita em um dia. Está proibido entrar de carro no centro histórico, por isso aconselhamos deixar o veículo em um dos muitos estacionamentos que estão ao redor da famosa cidade italiana.
A ideia de ficar hospedados em Camogli e fazer a visita em um dia é para evitar os preços salgados dos alojamentos em Florença, especialmente nesta época do ano. Deixamos Florença depois de um dia intenso e uma overdose de beleza com alguns versos da Divina Comédia do florentino Dante Alighieri: “não tenha medo, nosso destino não pode ser tirado de nós. É uma dádiva”.
O caminho de volta
Depois de 11 dias de viagem perseguindo a terrível e interessante história do rinoceronte de Dürer, chegou o momento de regressar a Lisboa, nosso ponto de partida. A ideia é fazer o mesmo caminho de volta, porém parando em diferentes cidades. As vezes, quando viajamos, a nossa percepção do tempo muda e a volta parece mais veloz que a ida.
Este texto vai te deixar com a mesma sensação, mas é de propósito. Como já não temos como guia o nosso famoso rinoceronte, a volta será rápida, porém igualmente interessante.
De Camogli partimos para Arles, que está a 466 quilômetros da cidade italiana. Fazemos uma parada para almoçar e conhecer alguns dos cenários imortalizados pelo pintor Vicent Van Gogh, que morou em Arles e ali pintou muitos de seus quadros.
Depois de almoçar e passear um pouco partimos para Nimes, que está apenas a 32 quilômetros de Arles. A ideia é passar só uma noite em Nimes para conhecer o centro histórico e sua famosa Arena, um anfiteatro romano edificado no ano 27 a.C.
Deixamos o território francês e entramos outra vez na Espanha em direção a Sitges, uma cidade catalã da costa mediterrânea famosa por um festival de cinema de terror e que está a 429 quilômetros de Nimes. O festival acontece no comecinho de outubro e, dependendo dos dias escolhidos para a road trip, vale a pena ajustar o calendário para ver o evento.
Além da experiência de ver um filme rodeado de fãs do gênero, há muitas atrações terroríficas pelas ruas da cidade. Sugerimos passar pelo menos uma noite em Sitges e partir para Toledo, localizada no centro da Espanha e a 655 quilômetros da cidade catalã.
Em Toledo temos uma grande mudança de cenário: deixamos atrás as praias para passear pela cidade histórica que foi descrita por Miguel de Cervantes como a “glória da Espanha”. Finalmente, depois de passar uma noite em Toledo e provar o famoso queijo manchego, fazemos nossos últimos 589 quilômetros de estrada e regressamos a Lisboa.
Recomeço
Ao retornar ao começo da nossa história, recomendamos levar na mala de volta a casa um souvenir imprescindível: o romance “A Viagem do Elefante” do grande escritor português José Saramago.
O livro narra uma história similar a do nosso rinoceronte, porém vivida por um elefante indiano, que em 1551 foi enviado como presente de casamento do rei João III ao arquiduque Maximiliano da Áustria. E se tiver interesse em conhecer mais sobre a história do animal que inspirou nossa viagem, recomendamos também “O rinoceronte do Papa” de Lawrence Norfolk.
Um detalhe interessante sobre a xilogravura de Dürer é que o artista alemão nunca viu o rinoceronte de Manuel I. A imagem foi baseada em descrições feitas por pessoas que viram o animal em Lisboa. Por isso, o desenho de Dürer possui algumas incoerências anatômicas. A obra, no entanto, exerceu uma grande influência nas artes.
Antes de embarcar de volta ao Brasil não esqueça de brindar pela memória do rinoceronte com um vinho do Porto ou um vinho Verde. A ignorância e vaidade de um rei provocaram sua morte prematura, mas nós quisemos homenageá-lo seguindo seus passos e transformando sua trágica odisseia em uma experiência única. Como disse Saramago, “a viagem não acaba nunca… O fim de uma viagem é apenas o começo de outra”.
Para ler as primeiras partes deste diário de viajante, só clicar aqui.