A Etiópia é um país de contrastes difícil de emoldurar com palavras. Imagine terras nas quais convivem mais de 80 grupos étnicos, em que são falados mais de 10 idiomas, com paisagens de savana e manadas de zebras. Imagine também altas montanhas verdes, igrejas escavadas em rocha conectadas por túneis e passarelas, e trilhas virgens cruzadas por apenas poucas dezenas de pessoas. Tudo isso é a Etiópia.
O país africano foi declarado pelo Conselho Europeu de Turismo o melhor destino de férias em 2015. Está situado no Chifre da África e tem em torno de 95 milhões de habitantes, segundo dados da Economist Intelligence Unit.
Os principais voos internacionais chegam pela capital, Adis Abeba, de quase 3,5 milhões de habitantes.
Cihan Kara, da Turkish Airlines, destacou que embora a alta temporada para viajar seja entre os meses de abril e outubro, “as características topográficas do país, que vão desde montanhas a desertos, permitem que os viajantes se desloquem durante todo o ano, dependendo da região”.
Uma viagem no tempo
O tempo transcorre em outro ritmo na Etiópia. O país adotou de forma oficial o calendário ortodoxo. Atualmente estão em 2009 e seus anos têm 13 meses.
Em alguns pontos, os instantes parecem eternos e em outros, as horas são efêmeros segundos. Lalibela é um desses lugares. Localizada na região de Amhara, no norte do país, a cidade leva o nome do rei que a criou e é visita obrigatória para os viajantes. Até o jornalista polonês Ryszard Kapuscinski se rendeu a sua magia, como se lê em “Ébano”, livro que reúne 29 crônicas do mestre dos jornalistas na África.
Lalibela, conhecida também como a pequena Jerusalém ortodoxa, esconde 11 maravilhas que, segundo conta a lenda, foram construídas por homens e anjos lado a lado: quase uma dúzia de igrejas monolíticas escavadas em rocha que superam espetacularmente outros templos erguidos de forma tradicional.
Seus criadores não usaram materiais externos em sua construção, nem tijolos nem blocos de pedra. O espaço negativo, esculpido na rocha por milhares de homens durante 24 anos no século XIII, desenha edifícios avermelhados de diferentes tamanhos e formas.
“Foram construídas por Deus” parece ser a resposta mais usada entre os guias turísticos diante da curiosidade do visitante sobre os aspectos técnicos dos templos.
Todos são diferentes e os mais conhecidos são Biet Medhani Alem (Salvador do Mundo), a 12 metros de profundidade; e Biet Ghiorgi (São Jorge), em forma de cruz.
Para entrar neles é preciso se registrar e pagar uma entrada de US$ 50, válida para quatro dias. Se quiser um guia, o preço da visita pode dobrar.
Oração na rocha
As orações na língua histórica ge-ez, rítmicas, potentes e hipnóticas, convidam a entrar no templo Biet Medhani Alem. Quase não há luz, a umidade do carpete vermelho que cobre o solo desigual sobe pelos pés descalços e o penetrante cheiro de incenso misturado com suor bate o olfato com força.
Em uma esquina, separada por uma cortina do resto da igreja, uma mulher extrai de um fosso uma espécie de joelho e, tombada no solo, começa a fazê-lo rodar por sua anatomia em uma espécie de transe buscando curar corpo e alma. Os cantos não param nem diminuem de intensidade.
Só os insistentes cliques das câmaras de alguns turistas rompem o encanto da cena.
Ao sair, se esquivando dos devotos que acompanham as rezas acomodados no solo, é necessário jogar um último olhar para memorizar os quadros amontoados verticalmente contra as paredes: as túnicas e os gorros de algodão branco usados pelos fiéis e a tênue luz que se cola furtiva por uma das pequenas janelas que permanecem abertas.
Religião, castelos e lendas
Após visitar Lalibela, é impossível não perceber a importância da religião na sociedade etíope. Cerca de 60% dos habitantes são cristãos e, ao contrário do que se pode pensar, isso não é consequência direta do colonialismo europeu no continente africano. O reino de Aksum abraçou o cristianismo como religião oficial no século IV. Foi o segundo território no mundo a fazê-lo, após a atual Armênia.
Gondar, que junto com Lalibela e Bahir Dar forma o principal triângulo turístico em Amhara, é conhecida como a Camelot etíope. Os castelos medievais e as colinas verdes surpreendem o turista.
A impressionante cidade fortificada de Fasil Ghebi, de 900 metros de perímetro, foi a residência do imperador Fasilides, que mandou construí-la no século XVII inspirado na arquitetura árabe e indiana.
Após a chegada dos jesuítas, como explicou a Unesco, metamorfoseou sua aparência adotando tinturas do barroco europeu.
Aksum é a última parada das viagens organizadas ao norte da Etiópia. Situado em Tigray, uma região que faz fronteira com a Eritreia, atrai beatos, curiosos e, certamente, fãs de Indiana Jones.
A Arca da Aliança
Seus habitantes se vangloriam por proteger a mesmíssima Arca da Aliança que o intrépido arqueólogo Indiana Jones tomou dos nazistas no cinema.
Vários monges protegem o Tabot, arca que, diz a lenda, contém as tábuas de lei com os 10 mandamentos que Deus entregou a Moisés. À ela são atribuídos poderes de acabar com o mal, burlar leis físicas e vencer os mais ferozes exércitos.
Segundo a crença popular, após a destruição do Templo do Rei Salomão, a arca foi levada a outro lugar, nunca revelado. No entanto, os milhões de etíopes cristãos creem e defendem que ela chegou ao país três mil anos pelas mãos de Menelik I, filho da rainha de Sabá e do rei Salomão.
Um pároco guarda o cofre cuidadosamente noite e dia. É sua única obrigação e sua maior satisfação. Ninguém teve acesso ao Tabot e sua autenticidade é mais do que duvidosa. Mas um dia, advertem os cristãos da antiga Abissínia, o segredo será revelado ao mundo. Por enquanto nada indica que isso vá acontecer em breve.
Natureza espetacular
O Parque Nacional de Simien foi um dos primeiros lugares do mundo a entrar na lista dos Patrimônios da Humanidade, no fim da década de 70. As montanhas de Simien são uma das mais espectaculares paisagens da África, assim como a fauna. O lobo de Simien é o mais raro do mundo. Já o macaco gelada é comum no parque.
Harar é a quarta cidade santa do Islã. Ela tem 82 mesquitas, três delas do século X, e 102 altares. Harar historicamente foi um centro comercial, ligado por rotas comerciais ao resto do Chifre da África, a Península Arábica e, através dos seus portos, ao resto do mundo.
São inumeráveis rotas, paisagens, cerimônias e experiências na Etiópia. Opções muito diferentes entre si, que tem em comum a todas elas, desde as coloridas e pinturescas tribos nômades no sul até a comunidade ortodoxa no norte, a amabilidade de sua gente e o irrefreável desejo de se perder em sua cultura.
A Etiópia é como seu prato mais popular, wot com injera, uma espécie de torta feito com uma pasta fermentada de teff, cereal local, sobre o qual são colocados diferentes tipos de carne e vegetais. É simples, intenso, forte, cabem todas as cores, aromas e sabores para se perder. E um grande lugar no qual se encontrar.
Dados Básicos
A República Democrática Federal da Etiópia, antigamente conhecida como Abissínia, fica no Chifre da África, sem saída para o mar. Faz fronteira ao norte com Djibuti e Eritreia; ao oeste com Sudão e Sudão do Sul; ao sul com Quênia e Somália; e ao leste com a Somália. Sua moeda é o birr (US$ 1 equivale a cerca de 20 birr).
A geografia etíope se caracteriza por um grande planalto dividido por duas amplas cadeias montanhosas, atravessadas pelo Vale do Rift. No Lago Tana, no noroeste do país, nasce o Nilo Azul, o afluente mais caudaloso do Nilo. O clima é muito variado e está fortemente influenciado pelo relevo.
Foi o primeiro reino cristão do mundo, sendo uma monarquia de origem hebraica.
No contexto africano, a Etiópia viu ratificada sua posição como capital diplomática da África ao abrigar a sede da União Africana, e é um dos países com maior crescimento anual nos últimos dez anos.